sexta-feira, março 21
quarta-feira, março 19
terça-feira, março 11
_______ZUENIR VENTURA_______
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SOBRE JORNALISMO
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trechos de artigos, palestras, discursos e aulas
"O jornalismo é um processo que exige incessante aperfeiçoa-mento, deve ser um constante aprendizado, um permanente exercício de humildade. O erro de hoje faz esquecer o sucesso de ontem. Um jornal pode ter 100 anos de existência, mas sua credibilidade dura 24 horas, ou seja, precisa ser renovada a cada dia. Um crédito perdido é muito difícil de ser recuperado, se é que é possível recuperá-lo. Talvez seja o capital mais difícil de acumular e mais fácil de perder. Em termos de televisão então, esse tempo se reduz a segundos, que é a unidade do veículo: a confiança pode ser perdida não em 24 horas, mas em segundos."
"Não viemos à Terra para julgar, nem para prender ou condenar, viemos para olhar e depois contar. Não somos juízes, não somos promotores, somos jornalistas, somos testemunhas de nosso tempo, uma testemunha crítica, não necessariamente de opo-sição, mas implacavelmente crítica. Não quarto poder, como a imprensa gosta de se proclamar, mas contra-poder, ou seja, independente em relação a todo poder – executivo, policial, econômico, político ou jurídico."
"O jornalista irresponsável não será menos irresponsável por ser jornalista. Ao contrário, o jornalista leviano é tão nocivo ao jornalismo quanto um censor conseqüente. Com uma vantagem para este último: em nenhum momento ele finge servir à imprensa."
"Não sou nostálgico dos velhos tempos, não acredito que o novo jornalismo tenha vindo para acabar com a criatividade, com o talento e a ética. Um sistema que possibilitou a existência de tão bons exemplos profissionais em todo o mundo não pode ser maldito por natureza. O problema é que no Brasil estamos vivendo uma fase de mutação, de rito de passagem. Já deixamos de ser e ainda não somos. Mantivemos alguns defeitos dos velhos tempos sem adquirir as virtudes dos novos."
"Uma crise pode ser paralisante, depressiva, mas também pode ser progressista, transfor-madora. Acredito, espero, que a nossa crise seja desse último tipo – seja uma crise adolescente, de transição de um sistema para outro. Ou, como se diria hoje, de um jornalismo pré-moderno para um jornalismo pós-moderno. Mas essa passagem tem que ser feita sem perda de substância e de valores."
"Podemos alcançar uma excelente técnica, podemos modernizá-la; devemos perseguir uma invejável estética, devemos embelezá-la; mas não devemos, não podemos suprimir a ética ou cancelar a responsabilidade social. Se não formos orientados por uma inatacável ética, a sociedade continuará desconfiando de nós. Há os que dizem que o jornalismo, por ser um ofício e uma técnica, não precisa de ética, ou que a ética é também uma questão de mercado. Sabe-se até onde isso pode chegar. O século XX nos ensinou que a técnica sem o controle da ética pode levar aos piores crimes. De bons técnicos Hitler estava cheio, e Stálin também."
"Mesmo numa sociedade controlada pelas leis do mercado, pela lógica do consumo, movida pela competição e o lucro, mesmo numa sociedade de espetáculos, de ditadura do marketing – eu diria que por isso mesmo, principalmente por isso – o jornalismo tem que ter um autocontrole, uma autocrítica, uma ética. A questão é que esse controle não pode ser remoto, não deve ser exercido por outros poderes. É inaceitável recebê-lo de fora. Não por corporativismo, mas porque isso já foi experimentado no Brasil, é a censura, cujos efeitos sabemos como foram desastrosos para todos, sobretudo para o país. Temos nós temos que cuidar de nossas feridas e enfrentar nossos próprios desafios. Temos que aprender que nosso direito à liberdade não pode se exercer como um atentado ao direito de privacidade do outro."
"A língua portuguesa não vem sendo bem tratada nas redações, essa é que é a verdade. Não só nas redações, pode-se alegar, mas também em outros lugares onde deveria ser respeitada: salas de aula, escritórios de advogados, universidades. Por toda parte transgridem-se as regras gramaticais, assim como se infringem as leis de trânsito. Em meio a outras crises, institucionais e de valores, há essa crise da palavra – escrita e oral – para preocupar o país. Como disse Octavio Paz, quando uma sociedade se corrompe, a primeira coisa que se decompõe é a linguagem."
"Considero a escrita jornalística um ótimo exercício de disciplina. É como o treino físico para o atleta. As exigências da linguagem de jornal, obrigando-nos a racionar o adjetivo e o advérbio, a trabalhar mais com o substantivo e o verbo, isto é, com o sujeito, o predicado e o objeto, categorias essenciais para a comunicação, são um ótimo exercício de contenção e parcimônia. As limitações de espaço são outra imposição que leva o jornalista a um permanente e salutar trabalho de corte e expurgo, de redução. Só é preciso tomar cuidado para que esse exercício asséptico não leve à penúria de estilo. Dependendo do regime, o emagrecimento é sinal de fraqueza e não de saúde."
"Sou de um tempo em que a imprensa não era um dado do mercado, mas um fenômeno da cultura. O jornal não era um produto industrial mas um bem cultural. A relação entre o leitor e o jornal era de absoluta independência. Não é que o veículo não precisasse de sustentação, mas ele acreditava que sua missão era de condutor. O seu destino era impor sua opinião ao leitor. Não lamento sistematicamente essa transformação. Acho que houve muito ganho. O saudosismo não deve ser um álibi para não se valorizar o presente. Nunca os Estados Unidos tiveram no passado um jornal tão bem feito e importante quanto o 'New York Times'. Nem a Europa um jornal tão interessante quanto o 'El País', só para ficar em exemplos não polêmicos porque distantes de nós."
"Na época da ditadura militar, a censura se exercia por corte. Havia penúria de informação. Hoje, ao contrário, há demais. Mas como o excesso produz ruído, entropia, confusão, ele acaba funcionando como uma nova espécie de censura – por indigestão."
"O melhor jornal brasileiro seria feito não com informação, mas com explicação."
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